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Artigo: Esperança e cautela no canabidiol



Novos medicamentos têm sido usados em pessoas com dores crônicas, epilepsia e esclerose múltipla


Resolução inédita tomada pela Anvisa, a portaria de 3 de dezembro de 2019 marcou história ao permitir a comercialização de produtos farmacêuticos à base do canabidiol. A decisão realça a esperança de milhares de pessoas no país, que veem nela uma melhor qualidade de vida para quem padece dos mais terríveis flagelos e a amenização de efeitos de diversas doenças através desses medicamentos.

Afinal, em que consiste o canabidiol?

Trata-se de um elemento químico que achamos tanto no cânhamo quanto na maconha. Importante é clarificar que ambas vêm da espécie cannabis.


O canabidiol é um dos mais de cem elementos químicos denominados canabinoides, que se acham presentes nas plantas da família cannabis e em suas variantes: sativa e ativa. Esses canabinoides interagem com o sistema regulatório essencial nos corpos humanos, bem como dos animais, chamado de ECS — sistema endocanabinoide, o qual usa três componentes para garantir numa neurotransmissão suave a troca de mensagens entre as células. Esses componentes incluem:


— receptores de canabidiol que são abundantes em todo o corpo e se ligam às membranas celulares para monitorar as mensagens entre as células;


— endocanabinoides ou moléculas ricas em gordura, que ativam os receptores de canabidiol e sinalizam outros sistemas para apoiar os ECS quando a homeostase é interrompida e;


— enzimas ou catalisadores que produzem endocanabinoides para interagir com receptores quando o ECS está desequilibrado.


A partir dos anos 40, começou-se a pesquisar os efeitos do CBD — como mundialmente o canabidiol é chamado. A partir de 1960, o doutor Raphael Mechoulam, professor de Química da Universidade Hebraica de Jerusalém, conseguiu destrinchar a estrutura química do CBD e se tornou a referência em pesquisa nessa área.


Dois mil e nove foi o ano da reviravolta, quando se impulsionou a pressão nos EUA, que tinham banido a cannabis como substância comercializável em 1906. Charlotte Figi, então com 3 anos, não passava uma hora sem convulsões epilépticas. Após internações constantes, seus pais tiveram contato e apoio dos Stanley Brothers, pioneiros no uso da maconha medicinal no Colorado — o estado americano desde 2000 permitia a utilização medicinal no caso de algumas doenças. Eles desenvolveram uma mistura de CBD e THC que denominaram Charlotte.


O produto trouxe significativos progressos na vida de Charlotte e chamou a atenção de toda a comunidade científica para os efeitos do CBD. Ousar dizer que o CBD é uma planta milagrosa seria um tanto forçoso, mas é importante ressaltar que há perigos nessa pesquisa. Primeiro, além do CBD, a cannabis produz o THC — tetraidrocanabinol —, que tem efeitos tóxicos fortes. Chegou-se, após estudos, à conclusão que qualquer patamar acima de 0,3% de THC dentro de qualquer medicamento de CBD certamente trará efeitos intoxicantes no organismo de quem o consumir.


Os novos medicamentos têm sido usados em pessoas com dores crônicas, epilepsia e esclerose múltipla, e os resultados têm sido animadores. Com tantas boas notícias, por que a Anvisa não autorizou o plantio? Assim como o país sofre de um problema de fiscalização, não de leis, como se fará o controle se porventura a Anvisa permitir laboratórios terem sua própria plantação para fins de extração do CBD?


Sabemos que há áreas do país controladas pelo crime organizado, que poderão constranger instituições sérias a produzir de forma sistemática remédios e drogas.


Infelizmente, não sabemos nem o número de focos de incêndios que atingem milhares de quilômetros de florestas todos os anos em nosso país. E, certamente, não teremos o poder fiscalizatório para determinar que alguém cumpra ipsis litteris a determinação da Anvisa.


Um estudo recente da Universidade de Berkeley conseguiu reproduzir de forma sintética em laboratório o CBD, o que abre uma fronteira segura sem necessidade de autorização de plantio, novamente dando ensejo a uma produção indesejada, seja de maconha ou haxixe.


A esperança reside agora na produção e na contínua pesquisa do canabidiol.

David Soares é deputado federal (DEM-SP)







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